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Marrocos e o destino

A ida do maridão para Marrocos trouxe muitos imprevistos, peripécias, aventura e muitas saudades. É aqui que irei tentar "expulsar" os medos, as tristezas, as alegrias e as saudades.

Marrocos e o destino

A ida do maridão para Marrocos trouxe muitos imprevistos, peripécias, aventura e muitas saudades. É aqui que irei tentar "expulsar" os medos, as tristezas, as alegrias e as saudades.

ontem foi um dia difícil...revivi cada momento do dia 23 de Janeiro.

Tinha ido ao hospital falar com a medica para saber porque tinhas ficado internada. Estive 3 horas para falar com ela. Esperei pacientemente, compreendia que primeiro estavam os doentes da urgência e que quando pudesse viria falar comigo. Assim foi...disse-me que estavas com uma inflamação grave na vesicular e que dependia de como o teu organismo reagisse.

Por um lado sabia que poderia correr mal, mas por outro como já tinhas passado por varias situações complicadas e superaste-as achei que ias dar a volta.

Fui ver-te, o papá já lá estava, os seu olhos estavam cheio de lágrimas e achei estanho, pois não era homem de choros. Tu ficaste com um sorriso enorme quando me viste e disseste "ai a minha filhinha". Conversámos um pouco, disseste que não tinhas dores apenas uma impressão no coração. Disseste-me que o fim estava perto e eu como sempre respondi-te abrutalhado..." se dizes isso não venho cá mais. Tu vais ficar bem". 

Lembro-me de ter saído para poder chorar sem me veres.  Falei com a enfermeira para lhe dar a conhecer essa impressão no coração. Questionei-a da tua situação, mas pediu-me para falar com a medica. Conversámos sobre o meu trabalho, da minha experiência com os idosos, do meu medo de não resistires.

Despedi-me de ti e ainda vejo a tua cara com um sorriso e o teu acenar com a mão. Recordo-me de dizeres ao papá "nino não te esqueças de pagar o telemóvel que acaba dia 27".

Saímos os 2 com lágrimas nos olhos e mais chorei quando ele me contou que o tinhas chamado a sua beira e lhe tinhas dito que ias morrer nesse dia.

Com a experiência que tenho em cuidar de idosos eu sabia que apesar da tua aparência tranquila tudo poderia desmoronar, mas eu queria acreditar que ia correr bem.

23, 23h toca o meu telemóvel...a noticia da tua partida fez-me sentir uma dor como nunca tinha sentido...

À uns meses o meu irmão e a esposa vieram passar uns dias a Portugal. Não altura não foi possível encontrarmos-nos. Uns dias mais tarde, já se tinham ido embora, a minha mãe telefona-me e diz-me " O mano deixou aqui uma coisa para ti, parece uma garrafa de vinho. Quando passas aqui para a vires buscar?"

Disse-lhe que passaria entretanto. Perguntei-lhe pelo meu pai e diz-me " foi a casa do M. levar uma prenda que o teu irmão deixou para ele." 

Achei muito estranho e pergunto-lhe " O mano deixou uma prenda para ele? Que estranho, eles não têm ligação e já não se vêm à anos"

-Pois não. O teu pai e eu também achámos estranho, mas a mulher do teu irmão disse que uma era para ti e a outra era para o M.

Uns dias mais tarde ao telefone agradeço a garrafa ao meu irmão e ele pergunta-me se o bolo era bom. Fiquei confusa e digo-lhe "Bolo? Que Bolo?

- A mãe não te deu um bolo?

-Não, mas não te preocupes. Se calhar esqueceu-se.

De repente lembro-me do tal presente para o M e pergunto " tu deixaste-lhe algum presente para o M?

- Para o M? Mas porque havia de deixar? Já não nos vemos à anos?

Estava explicado, a nossa velhota mais uma vez tinha feito confusão.

O meu irmão falou com ela e ela continua a jurar a pés juntos que a mulher dele é que fez confusão. Portanto a culpa é da minha cunhada (que não conhece a pessoa em questão) e não da minha mãe.

Felizmente o engano não foi grave e ainda deu para rir ( cá em casa)

 

Já aqui tinha contado que a minha mãe está a ficar confusa, mas a coisa está a piorar e muito. Já fez exames e os médicos dizem que estas confusões fazem parte da idade. É verdade que trabalho à vários anos com idosos e estas confusões são "o prato do dia" mas a verdade é que quando são os nossos é mais difícil de aceitar.

Esta semana conversávamos sobre um familiar que mora no estrangeiro e que tinha chegado de ferias.

Mãe- Ele está praticamente cego e os médicos dizem que não o podem operar.

 Eu- Não podem? Então porquê?

Mãe- Tem Alzheimer e os médicos dizem que com essa doença não o podem operar.

Eu- Não podem? Engraçado nunca tinha ouvido falar que uma pessoa com essa doença não podia ser operado aos olhos.

Mãe- Pelo menos em França não operam. O teu pai também tem essa doença...

Eu- O meu pai tem essa doença? Desde quando?

Mãe- Já à muito anos. Não te lembras de ele andar muito tempo nas consultas em Coimbra?

Eu- Sim lembro, mas quem disse que o meu pai tem Alzheimer?

Mãe- Foi o medico lá em Coimbra. 

Fiquei ali a pensar nas consultas de especialidade que ele teve em Coimbra e se me tinha escapado algo. De repente faz-se luz e pergunto-lhe " Mamã tu sabes o que é Alzheimer?"

Mãe- Claro que sei, é a doença nos olhos.

Eu- Tu não estás a querer dizer Glaucoma?

Mãe- Ah pois é isso mesmo. Oh filha não ligues, é a minha cabeça.

 

Quinta feira foi dia de aniversario da minha mãe. 84 Anos...já se notam alguns períodos de esquecimento, algumas confusões, até com conversas simples, alguns problemas de saúde, mas ainda assim não aparenta a idade que tem.

Comprei-lhe um bolo e fui até lá almoçar com eles. Vi a tristeza de não ter mais ninguém ali. O outro filho está no estrangeiro, 1 dos netos também e os restantes 4 estavam a trabalhar.

Sai de lá com a certeza que nenhum deles se iam lembrar do aniversario dela e resolvi dar uma ajudinha para alegrar mais um pouco o seu dia.

Mandei mensagem aos 4 a avisar da data e de como ela iria ficar feliz com um telefonema.Pedi-lhes para não revelarem que fui eu que os lembrei.

No dia seguinte telefonei para saber como estava e diz-me:

- Ontem tive tantos telefonemas a desejarem feliz aniversario. E sabes quem me telefonou?

- Não.

- Os meus netos todos. Fiquei tão feliz. Mas não sei como se lembraram...

- Sabes que hoje em dia colocamos as datas importantes no telemóvel para assim não nos esquecermos.

- Pois então deve de ter isso, mas fiquei tão contente.

Uma pequena mentira que lhe mudou o dia.

É assustador ver que aquela mulher com uma memoria fantástica, que tinha conversas com nexo e que tomava decisões sem hesitar não é mais a mesma. Falo da minha mãe.

Hoje veio-me visitar e no meio da conversa do costume sobre doenças tira 2 termómetros da mala(dos antigos) e pergunta-me:

-É melhor deitar isto para o lixo não é?

-Então porquê?

-Porque já não tem pilhas e não dá nada.

-Mas isso não é de pilhas. Sentes febre?

-Febre? Não...

-Então para que queres o termómetro?

-Para medir a tensão.

Não sei se ria se chore

Quando a minha mãe viu o móvel novo de sala deu-se este dialogo:

Mãe- Vais pintar o móvel?

Eu- Pintar o móvel?

Mãe- Sim, se o vais pintar?

Eu- Mas porque é que ia pintar o móvel se ele é novo?

Mãe- Sei lá podias querer pinta-lo. Há gente que os pintam.

Pai- Oh mulher então a tua filha ia pintar um móvel novo?

A conversa ficou por ali, mas fiquei a pensar que a minha velhota estava a ficar tolinha. Mas porque raio ia eu pintar um móvel acabadinho de chegar?

Só descobri o porquê quando contei ao Miguel. Quer dizer não fui eu que descobri, foi ele, já que eu não chegava lá.

Acredito que ao verem as fotos cheguem lá mais rápido do que eu.

 

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