Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Marrocos e o destino

A ida do maridão para Marrocos trouxe muitos imprevistos, peripécias, aventura e muitas saudades. É aqui que irei tentar "expulsar" os medos, as tristezas, as alegrias e as saudades.

Marrocos e o destino

A ida do maridão para Marrocos trouxe muitos imprevistos, peripécias, aventura e muitas saudades. É aqui que irei tentar "expulsar" os medos, as tristezas, as alegrias e as saudades.

A ultima noite foi vivida com um misto de emoções. Por um lado a tristeza por outro o alivio.

Penso que não será difícil aceitar que na minha profissão nos afeiçoamos mais a uns utentes que a outros, tal como na vida privada também criamos mais empatia por certas pessoas.

Não me recordo ao certo quando a D. F. deu entrada na Instituição, mas já lá vão pelo menos 6 anos. Uma senhora com uma personalidade bem vincada, mas que nos tratava sempre com educação. Muitas das peripécias engraçadas relacionadas com o meu trabalho foram vividas graças a ela.

Há muito que a maldita doença apareceu e aos poucos foi levando a melhor. Nos últimos dias estávamos à espera do seu fim. Confesso que ansiei que ele chegasse para poder deixar de sofrer. Tinha um carinho tremendo por ela e sabia que ela também o tinha por mim por esse motivo fiquei aliviada por ter sido no meu turno e ter sido junto de mim que faleceu. Não duvido que se pudesse me teria dito "obrigado por estar ao pé de mim D. Joana".

Hoje senti vontade de ir ao meu antigo blog Geriatriaaminhavida e ler as aventuras que passei com ela.

Aqui fica uma amostra:

 

"Dei por mim a pensar como seria a minha vida(de trabalho, claro) sem a D. F. e não me parece que fosse muito interessante.

Tenho a noção que ela é chata e muitas vezes não diz coisas com grande sentido, mas que a mulher tem graça{#emotions_dlg.lol} , lá isso tem.

Então a ultima vez que a deitei, foi para uma risota.

E esta ultima vez, foi exactamente um dia após a cena da D. A e o famoso cheiro do vinagre e do spray para matar as moscas.

Quando entrei no quarto, estava a rezar o terço, como sempre.

Perguntei-lhe qual era o liquido que queria ser esfregada.

-Hoje não é nenhum, quero evitar discussões com a A...

Fiquei tão feliz de ouvir tal coisa que pensei logo "Ok, estou safa do maldito cheiro".

Estragou logo o meu pensamento, com a frase "mas, é só hoje, porque não lhe vou fazer a vontade".

Fiquei desiludida, mas o trabalho tinha de continuar, pelo menos naquela noite estava safa.

Quanto a despir-lhe a roupa, tem de ser pela ordem que ela quer e não como nos dá mais jeito. Depois de lhe colocar a fralda e aproveitando que estava em pé tentei vestir-lhe a calças de pijama.

-Oh, menina as calças são vestidas comigo deitada.

Ainda que fosse mais fácil vesti-la levantada, fiz o que me pediu. Já deitada diz-me:

-Então não me vestiu o casco de dormir?{#emotions_dlg.unknown}

Não pensem que ela estava despida, tinha o soutien, a camisola interior e ainda a camisa de dormir.

-Oh D. F. já a visto. Não foi a senhora que se quis deitar?

-Pois fui, mas tinha de me vestir o casaco primeiro, assim os meu pulmões estão a apanhar frio...

-Frio? Com toda a essa roupa vestida?

-Isto não é nada bom para os pulmões...

A mulher não estava boa da cabeça, então tinha-lhe acabado de despir um blusa fininha e um casaco de malha e só agora é que os pulmões iam sofrer?

-Então durante o dia não tem frio e aqui no quarto já tem?

-O colchão é que me faz frio. Este material não é nada bom.

Não adiantava nada tentar convence-la do contrario, por isso não lhe falei mais do assunto.

-Vou ter de mudar a cama para a janela.

- O quê{#emotions_dlg.amazed}? Mudar a cama, novamente?

Devo dizer que anteriormente ela dormia ao lado da janela, mas por achar que ficaria mais perto da casa de banho, pediu para lhe mudarem a cama.

-Tem de ser porque não aguento o mau cheiro...

- Que cheiro?

- Quando entrei no quarto, senti um cheiro horrível e vinha dessa, ai do lado.

Ainda pensei que falava da D. A, mas referia-se à D. G. Concordo que o meu nariz suporta odores que para o comum dos mortais são nauseabundos, mas ali não sentia nada.

-Oh D. F. não cheira nada, tanto mais que a roupa foi toda mudada. Além do  mais qual a diferença do cheiro se a cama dela se mantiver ao lado da janela?

-Então não há diferença? Ali está encostada à parede e como não há circulação de ar o cheiro acumula-se ali...

-Então a solução é não fechar a porta...

- Mas assim há corrente de ar.

-Quer dizer, a senhora pode-se queixar de um cheiro que não existe e a D. A. não se pode queixar do cheiro a vinagre?

-Ah, mas o vinagre é um desinfectante...

-Mas não deixa de ter um odor horrível! Eu digo-lhe se um dia tiver de ir para um Lar e se a minha colega se esfregar com isso eu vou-me embora...

-Vai se tiver para onde ir!

"Raio", mas a mulher tem razão!"

 

 

"Depois de ter passado uns dias desanimada e a resmungar com o meu trabalho na instituição, eis que aparecem dias que me fazem rir.

E quem me poderia fazer rir?

A D. F. a tal senhora do vinagre.

Ela tinha ido a casa na altura do Natal e quando regressou trouxe mais uma roupinha(como se tivesse pouca). Roupa essa que necessitava de ser marcada.

Na altura que me pediu eu não tive tempo e disse-lhe  para pedir às colegas do turno da manhã.

No dia seguinte fiz tarde e pede-me novamente:

-Peço desculpa mas agora não posso. Então não pediu às colegas?

-Pedir pedi mas nenhuma o fez...

- Não deviam ter tido tempo. Olhe, amanhã pede novamente, se elas tiverem oportunidade marcam-lha.

Uns dias depois, mal me vê reclama novamente à cerca da roupa não estar marcada.

- A minha roupa ainda não está marcada e faz-me tanta falta...

Eu até a percebo, pois também eu gosto de ter toda a minha roupa pronta a vestir. Normalmente, queremos sempre a roupa ou que está suja ou a que está por passar, não é?

Nesse dia foi novamente impossível fazer o que me pediu. Pode parecer estranho para quem não sabe das tarefas que há a fazer numa Instituição, mas elas são tantas e estão de tal maneira programadas que qualquer coisa que impeça o normal funcionamento vai alterar tudo. Especialmente sendo poucas funcionarias, como tinha sido o caso.

Prometi-lhe que no dia seguinte logo que chegasse lhe iria marcar a roupa.

O prometido é devido e assim fiz quando ontem cheguei.

Infelizmente lá estava ela no seu quarto. Digo infelizmente porque é uma senhora que faz muitas queixas das colegas, obviamente quando está com as outras, o fará de mim.

Como eu esperava, lá veio um rol de queixas. Ora era porque uma funcionaria a detesta e faz tudo para a enervar, ora porque uma outra lhe colocou os sapatos em cima da cama quando os podia ter colocado na cadeira, outra que abre a janela quando lhe vai fazer a higiene e assim fica constipada...

Ela falava e eu ouvia, mas nada comentava, até que diz:

-Tanto cachecol que eu tinha e agora quero um e não tenho.

Das duas uma ou eu ouvi mal ou ela estava louca.

 Eu estava a ver um monte deles!

-Não tem cachecóis? Mas estão aqui sete. Só falta um, que deve de estar na lavandaria(tinha contado na lista quantos tinha trazido).

-Estão ai? Pois deviam tê-los colocado ai hoje à tarde...

-Não colocaram não, pois ainda ontem eu vim deita-la e eles estavam aqui.

-Estavam? Ai menina não percebo...então eu não os vi!

Deixa de falar dos cachecois e começa a falar nos casacos.

-Vejam lá eu com tantos casacos e tive de vestir este.

Ai, ai, ai! Vai dar comigo em doida!

Agarrei no monte dos casacos e tirei-os todos para cima da cama.

-Quantos é que quer? Tem aqui 10...

-Onde é que eles estavam?

-Aqui mesmo!

- Não sei o que se passa...

-D.F. eu acho que é melhor ir ao oftalmologista, esses óculos não devem estar bons!

-Mas eu estive ai e não os vi...

Oh, Deus do Céu dá-me paciência!

Eu poderia dizer que não gosto dela, mas não é verdade...ela diverte-me com a sua maluqueira.

Nesses mesmo dia teve a visita da família e claro mais roupa chegou.

Provavelmente vai-me calhar, novamente marca-la."

 

Paz à sua alma, D. F.

15 comentários

Comentar post